Este blog foi criado para fornecer as atualizações da obra Direito Sumular STF & STJ, que são periodicamente elaboradas pela autora na forma de artigos jurídicos publicados em diversas revistas e periódicos. Disponibilizaremos também outros trabalhos acadêmicos da autora, bem como matérias, notas e notícias.

Do Prefácio - Ministro Luiz Fux
Ministro do Supremo Tribunal Federal
Professor Titular de Direito Processual da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ)



quarta-feira, 25 de março de 2015

ATUALIZAÇÃO N.6: Súmula 62 do STJ atualizada

 

QUAL A JUSTIÇA COMPETENTE PARA PROCESSAR E JULGAR O CRIME DE FALSA ANOTAÇÃO OU OMISSÃO DE REGISTRO NA CTPS?

Resumo: Em 1992, o Superior Tribunal de Justiça criou a Súmula 62, com a seguinte redação: “Compete à Justiça Estadual processar e julgar o crime de falsa anotação na carteira de trabalho e previdência social, atribuído a empresa privada”. Em fevereiro de 2008, o julgamento do CC 58443 MG pela 3ª Seção do STJ representou claramente um indicativo de modificação jurisprudencial apta a ensejar a superação da mencionada Súmula 62 do STJ. Naquela ocasião, a Corte decidiu que compete à Justiça Federal (e não à Justiça Estadual) julgar o crime de omissão de anotação de vínculo empregatício na CTPS. No entanto, esta Súmula continuou sendo amplamente aplicada pelos tribunais, inclusive pelo Superior Tribunal de Justiça. Mais recentemente, no ano de 2014, no julgamento do AgRg no CC 131442 RS e do CC 135200 SP, a 3ª Seção do STJ volta a afirmar a competência da Justiça Federal para julgar o crime de omissão de anotação de vínculo empregatício na CTPS, opondo-se novamente ao entendimento outrora fixado em 1992 na Súmula 62 do STJ. Neste cenário, cumpre indagar: estaria a Súmula 62 do STJ superada?

Sumário: 1. Considerações iniciais. 2. O comando da Súmula 62 do STJ. 3. O julgamento do CC 58443 MG pela 3ª Seção do STJ em fevereiro de 2008. 4. O julgamento do AgRg no CC 131442 RS e do CC 135200 SP pela 3ª Seção do STJ em outubro de 2014. Conclusão. Notas. Referências.

1. CONSIDERAÇÕES INICIAIS

A CTPS foi instituída pelo Decreto n. 21.175/1932 e regulamentada pelo Decreto n. 22.035/1932, sendo o documento considerado obrigatório para todo trabalhador.

Pode-se conceituar a Carteira de Trabalho e Previdência Social como o documento de identificação profissional do trabalhador, provando a existência de contrato de trabalho e o tempo de serviço. Vale dizer, as anotações feitas na CTPS servem de prova do contrato de trabalho, do tempo de serviço do trabalhador, bem como das informações regularmente constantes do mencionado documento.[1]
Ressalte-se que a CTPS é o único comprovante da vida funcional do empregado, que irá garantir os direitos trabalhistas, os benefícios previdenciários e o Fundo de Garantia do Tempo de Serviço - FGTS.[2]

Consoante o art. 29 da CLT e art. 201 da CF/88, a CTPS será obrigatoriamente apresentada, contra recibo, pelo trabalhador ao empregador que o admitir. Cabe ao empregador, ao contratar o empregado, realizar as anotações e contribuir para a Previdência Social, garantindo-lhe os direitos trabalhistas e previdenciários.

2. O COMANDO DA SÚMULA 62 DO STJ

Em 26 de novembro de 1992, o Superior Tribunal de Justiça editou a Súmula 62 com a seguinte redação:

  • Súmula 62: Compete à Justiça Estadual processar e julgar o crime de falsa anotação na carteira de trabalho e previdência social, atribuído a empresa privada.

Com a edição deste enunciado, o STJ fixa o entendimento de que a competência para julgar o crime de falsificação de documento público, consistente na falsa anotação na CTPS, seria da Justiça Estadual. Isso por entender que, neste caso, a ofensa seria a bem jurídico de direito privado, não havendo lesão a bens, serviços ou interesses da União a invocar a competência da Justiça Federal (art. 109, I da CF/88).

Ficaria afastada a aplicação da Súmula 62 do STJ apenas quando verificado que a intenção do agente era criar condições para obtenção de benefício previdenciário junto à Autarquia Previdenciária (INSS). Neste caso a competência seria da Justiça Federal. Vale dizer: não havendo lesão ao INSS capaz de atrair a competência da Justiça Federal, o agente deveria responder pelo delito de anotação falsa na CTPS perante a Justiça Estadual.

A jurisprudência passou a distinguir duas situações fáticas para fins de fixação dessa competência: [3]

a) A primeira é a hipótese em que determinada empresa privada deixa de anotar o período de vigência de contrato de trabalho de um empregado na CTPS ou anota período menor do que o realmente trabalhado com o fito de não reconhecer o vínculo empregatício e, assim, frustrar os direitos trabalhistas do indivíduo.

b) A segunda hipótese é aquela em que são inseridos dados falsos na CTPS, fazendo constar como período de trabalho que na realidade não existiu, com o fito de serem criadas condições necessárias para se pleitear benefício previdenciário junto ao INSS.

Na primeira hipótese, não haveria qualquer prejuízo a bens, serviços ou interesses da União, senão, por via indireta ou reflexa, do INSS na anotação da carteira, dado que é na prestação de serviço que se encontra o fato gerador da contribuição previdenciária (Súmula 62 do STJ). Por outro lado, na segunda, a lesão à União seria evidente, porque a conduta é cometida com a intenção de obter vantagem indevida às custas do patrimônio público. Neste caso, a competência seria da Justiça Federal (art. 109, I, CF/88).[4]

3. O JULGAMENTO DO CC 58443 MG PELA 3ª SEÇÃO DO STJ EM FEVEREIRO DE 2008

No julgamento do CC 58443 MG, em fevereiro do ano de 2008, a Egrégia 3ª Seção do Superior Tribunal de Justiça decidiu que compete à Justiça Federal julgar ação criminal em detrimento de empregador que, em decorrência de ausência de anotações na CTPS, não assegura direitos trabalhistas ao empregado. [5]

Confira:

“Conflito negativo de competência. Penal. Art. 297, § 4°, do código penal. Omissão de lançamento de registro. Carteiras de Trabalho e Previdência Social. Interesse da previdência social. Justiça federal.
1. O agente que omite dados na Carteira de Trabalho e Previdência Social, atentando contra interesse da Autarquia Previdenciária, estará incurso nas mesmas sanções do crime de falsificação de documento público, nos termos do § 4° do art. 297 do Código Penal, sendo a competência da Justiça Federal para processar e julgar o delito, consoante o art. 109, inciso IV, da Constituição Federal.
2. Competência da Justiça Federal.” (CC 58.443-MG, Re. Min. Laurita Vaz, 3ª Seção, unânime, DJ 26/03/2008)

Conforme destacou a ilustre ministra relatora em seu voto:

“Verifica-se, de plano, que o principal sujeito passivo do delito é o Estado, representado pela Previdência Social e, em segundo lugar, a vítima, que deixa de possuir as benesses do registro de sua CTPS.
Dessa forma, existindo interesse da Previdência Social, que integra diretamente a Seguridade Social prevista no art. 194 da Constituição Federal, evidencia-se a competência da Justiça Federal para processar e julgar o feito, nos termos do art. 109, inciso IV, da Constituição Federal.”

No mesmo sentido é a lição de Celso Delmanto, de que o sujeito passivo do crime seria, “primeiramente, o Estado, representado pela Previdência Social; secundariamente, o segurado e seus dependentes que vierem a ser prejudicados”. [6]

Muito embora o julgamento do CC 58443 MG tenha representado claramente um indicativo de modificação jurisprudencial apta a ensejar a superação da Súmula 62 do STJ, este enunciado continuou sendo aplicado pelo Superior Tribunal de Justiça, como se pode conferir a partir dos julgados a seguir colacionados:

“(...) Hipótese em que empresa privada deixa de anotar na CTPS da empregada os dados referentes às atualizações ocorridas no contrato de trabalho, com o fito de frustrar direitos trabalhistas, dando origem a reclamação trabalhista. Não se vislumbra qualquer prejuízo a bens, serviços ou interesses da União, senão, por via indireta ou reflexa, do INSS na anotação da carteira, dado que é na prestação de serviço que se encontra o fato gerador da contribuição previdenciária. Entendimento da Súmula n.º 62 do STJ (...)”. STJ - CC 114168 SP, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, 3ª Seção, DJe 25/11/2010

“(...) 1. A Terceira Seção deste Superior Tribunal de Justiça vem decidindo que compete à Justiça Estadual processar e julgar o crime de falsificação de documento público, consistente na omissão de anotação de período de vigência do contrato de trabalho de único empregado, tendo em vista a ausência de lesão a bens, serviços ou interesse da União, consoante o disposto na Súmula 62/STJ. 2. Ressalva do posicionamento deste relator, no sentido de que a conduta descrita no delito capitulado no § 4º do art. 297 do Código Penal, tem como principal sujeito passivo do crime a Autarquia Previdenciária, e secundariamente o trabalhador, razão pela qual a competência seria da Justiça Federal. 3. Conflito conhecido para declarar competente o Juízo de Direito da Vara de Inquéritos Policiais de Curitiba/PR, o suscitante.” STJ – CC 108535 PR, Rel. Min. Jorge Mussi, 3ª Seção, DJe 20/05/2010.

4. O JULGAMENTO DO AGRG NO CC 131442 RS E DO CC135200 SP PELA 3ª SEÇÃO DO STJ EM OUTUBRO DE 2014

Mais recentemente, no julgamento do AgRg no CC 131442 RS e do CC135200 SP, a 3ª Seção do STJ veio novamente a afirmar que compete à Justiça Federal – e não à Justiça Estadual – processar e julgar o crime caracterizado pela omissão de anotação de vínculo empregatício na CTPS (art. 297, § 4º, do CP).

Nesta ocasião, a 3ª Seção afirmou que, no delito tipificado no art. 297, § 4º, do CP (figura típica equiparada à falsificação de documento público), o sujeito passivo é o Estado e, eventualmente, de forma secundária, o particular – terceiro prejudicado com a omissão das informações –, circunstância que atrai a competência da Justiça Federal, conforme o disposto no art. 109, IV, da CF.

Confira a ementa do aludido julgamento da 3ª Seção do STJ:

“Compete à Justiça Federal – e não à Justiça Estadual – processar e julgar o crime caracterizado pela omissão de anotação de vínculo empregatício na CTPS (art. 297, § 4º, do CP). A Terceira Seção do STJ modificou o entendimento a respeito da matéria, posicionando-se no sentido de que, no delito tipificado no art. 297, § 4º, do CP – figura típica equiparada à falsificação de documento público –, o sujeito passivo é o Estado e, eventualmente, de forma secundária, o particular – terceiro prejudicado com a omissão das informações –, circunstância que atrai a competência da Justiça Federal, conforme o disposto no art. 109, IV, da CF (CC 127.706-RS, Terceira Seção, DJe  3/9/2014). Precedente citado: AgRg no CC 131442 RS, Terceira Seção, DJe 19/12/2014) STJ - CC 135200 SP, Rel. originário Min. Nefi Cordeiro, Rel. para acórdão Min. Sebastião Reis Júnior, julgado em 22/10/2014, DJe 2/2/2015.

Ora, o crime de falsa anotação ou omissão de registro na CTPS trata-se de um delito que atenta contra a higidez do sistema previdenciário - gerido por autarquia federal (o INSS) – já que pode reduzir ou impedir o correto recolhimento da contribuição previdenciária.[7]

Observe-se que, à época da edição da Súmula 62, o Código Penal ainda não havia sido alterado pela Lei n. 9.983/2000, que introduziu os §§, 3º e 4º no art. 297 daquele estatuto. Confira:

  • CP. Art. 297 - Falsificar, no todo ou em parte, documento público, ou alterar documento público verdadeiro: Pena - reclusão, de dois a seis anos, e multa. (...)
    § 3º Nas mesmas penas incorre quem insere ou faz inserir: I – na folha de pagamento ou em documento de informações que seja destinado a fazer prova perante a previdência social, pessoa que não possua a qualidade de segurado obrigatório; II – na Carteira de Trabalho e Previdência Social do empregado ou em documento que deva produzir efeito perante a previdência social, declaração falsa ou diversa da que deveria ter sido escrita; III – em documento contábil ou em qualquer outro documento relacionado com as obrigações da empresa perante a previdência social, declaração falsa ou diversa da que deveria ter constado.
    § 4º Nas mesmas penas incorre quem omite, nos documentos mencionados no § 3º, nome do segurado e seus dados pessoais, a remuneração, a vigência do contrato de trabalho ou de prestação de serviços. (Incluído pela Lei nº 9.983, de 2000) (grifos nossos)

CONCLUSÃO

A falsa anotação ou omissão de registro de lavor na CTPS de empregado constitui fato típico previsto atualmente no art. 297, § 3º, II e § 4º, do CP.

À luz do entendimento fixado pela 3ª Seção do STJ em outubro de 2014 (AgRg no CC 131442 RS e CC135200 SP), no delito tipificado no art. 297, § 4º, do CP (figura típica equiparada à falsificação de documento público), o sujeito passivo é a Autarquia Previdenciária (INSS) e, eventualmente, de forma secundária, o particular (terceiro prejudicado com a omissão das informações), por isso a competência é da Justiça Federal. Nessa mesma linha já havia se posicionado a 3ª Seção do STJ em fevereiro de 2008 (CC 58443 MG).

Vale dizer, a falsa anotação ou omissão de registro na CTPS acarreta potencial lesão ao interesse e patrimônio da União, por isso atrai a competência da Justiça Federal (art. 109, IV, CF).

Esta orientação veio de encontro àquela fixada na Súmula 62 do STJ, criada em 1992, época em que o CP ainda não havia sido alterado pela Lei n. 9.983/2000, que introduziu os §§, 3º e 4º no art. 297 do CP.

Muito embora o STJ ainda não tenha afirmado expressamente que a Súmula 62 foi superada, a análise da jurisprudência da Corte indica claramente nesse sentido, razão pela qual esta Súmula merece ser cancelada.

 

REFERÊNCIAS

DELMANTO, Celso. Código Penal Comentado e Legislação Complementar, 7ª ed. Rev. e Atualizada, Renovar: RJ, 2007, p. 742

GARCIA, Gustavo Filipe Barbosa. Manual de Direito do Trabalho, 3ª ed. São Paulo: Método, 2011, p. 122 et. seq

 

Alice Saldanha Villar

Advogada e autora dos livros “Direito Sumular - STF” e Direito Sumular - STJ”, Editora JHMIZUNO, São Paulo, 2015 - Prefácio do Ministro Luiz Fux.


[1] Cf. GARCIA, Gustavo Filipe Barbosa. Manual de Direito do Trabalho, 3ª ed. São Paulo: Método, 2011, p. 122 et. seq

[2] Cf. STJ – Voto da Ministra Laurita Vaz (Relatora) no CC 58443 MG, 3ª Seção, DJe 26/03/2008.

[3] Cf. STJ - CC 99451 PR, Rel. Min.JORGE MUSSI, 3ª Seção, DJe 27/08/2009.

[4] Odem.

[5] A respeito do tema, indicamento a leitura de FISCHER, Douglas. O equívoco da Súmula 62 do STJ: anotação falsa ou omissão de anotação em CTPS é crime de competência federal. Revista de Doutrina da 4ª Região, Porto Alegre, n. 24, jun. 2008. Disponível em: http://www.revistadoutrina.trf4.jus.br/artigos/edicao024/Douglas_Fischer.html Acesso em: 20 mar. 2015.

[6] Cf. DELMANTO, Celso. Código Penal Comentado e Legislação Complementar, 7ª ed. Rev. e Atualizada, Renovar: RJ, 2007, p. 742 e 743 – Citado no Voto do Ministro JORGE MUSSI (Relator), no CC 108535 PR, 3ª Seção, DJe 20/05/2010.

[7] Cf., nessa mesma linha: TRF2 - RECURSO EM SENTIDO ESTRITO  2009.51.05.000391-5, Rel. Des. André Fontes, DJU 16/10/2014.

quinta-feira, 19 de março de 2015

ATUALIZAÇÃO N.5: Novas Súmulas Vinculantes do STF comentadas

O Plenário do Supremo Tribunal Federal aprovou no dia 11 de março de 2015 quatro Propostas de Súmula Vinculante (PSV). Tratam-se de verbetes de Súmulas do STF que foram convertidos em Súmulas Vinculantes com o objetivo de conferir agilidade processual e evitar o acúmulo de processos sobre questões idênticas e já pacificadas no Tribunal. As propostas foram formuladas pelo Ministro Gilmar Mendes, Presidente da Comissão de Jurisprudência do STF.
Súmula Vinculante 38: É competente o município para fixar o horário de funcionamento de estabelecimento comercial. Data da aprovação pelo Plenário: 11/03/2015.
A presente Súmula Vinculante reproduz exatamente o enunciado da Súmula 645 do STF (DJ 09/10/2003), já comentada no livro “Direito Sumular-STF”, Capítulo III (Direito Administrativo).
A partir da sua publicação na imprensa oficial, a Súmula Vinculante 38 terá efeito vinculante em relação aos demais órgãos do Poder Judiciário e à Administração Pública direta e indireta, nas esferas federal, estadual e municipal.
Súmula Vinculante 39: Compete privativamente à União legislar sobre vencimentos dos membros das polícias civil e militar e do corpo de bombeiros militar do Distrito Federal. Data da aprovação pelo Plenário: 11/03/2015.
A regra da presente Súmula Vinculante já era prevista na Súmula 647 do STF (DJ 09/10/2003), já comentada no livro “Direito Sumular-STF”, Capítulo IV (Direito Constitucional).
A nova Súmula acrescentou apenas a menção ao corpo de bombeiros militar do Distrito Federal. Compare:
    • Súmula 647 do STF: “Compete privativamente à União legislar sobre vencimentos dos membros das polícias civil e militar do Distrito Federal”.
A regra da Súmula 647 do STF sempre teve por fundamento o inc. XIV do art. 21 da CF/88:
    • CF/88. Art. 21. Compete à União: (...) XIV - organizar e manter a polícia civil, a polícia militar e o corpo de bombeiros militar do Distrito Federal, bem como prestar assistência financeira ao Distrito Federal para a execução de serviços públicos, por meio de fundo próprio; (Redação dada pela EC nº 19, de 1998) (grifo nosso)
Como se percebe, a nova Súmula Vinculante 39 do STF, ao agregar em seu enunciado a menção ao corpo de bombeiros militar do Distrito Federal, apenas reproduziu o que já era texto constitucional.
Conforme bem observou o ilustre Ministro Carlos Britto no julgamento da ADI 1045 DF, o inciso XIV do art. 21 da Constituição afirma que compete à União não só organizar, mas também manter, isto é, financiar, subsidiar, custear os vencimentos de todos esses corpos da segurança pública: polícia civil, polícia militar e corpo de bombeiros militar do Distrito Federal. Nessa medida o Distrito Federal, legislando sobre esta matéria estaria fazendo cortesia com o chapéu alheio, porque quem vai arcar com as despesas é a União. Então é compreensível que a União detenha com exclusividade o poder de legislar sobre a matéria.[1]
A partir da sua publicação na imprensa oficial, a Súmula Vinculante 39 terá efeito vinculante em relação aos demais órgãos do Poder Judiciário e à Administração Pública direta e indireta, nas esferas federal, estadual e municipal.
Súmula Vinculante 40: A contribuição confederativa de que trata o artigo 8º, IV, da Constituição Federal, só é exigível dos filiados ao sindicato respectivo. Aprovada pelo Plenário do STF em 11/03/2015.
A presente Súmula Vinculante reproduz exatamente o enunciado da Súmula 666 do STF (DJ 09/10/2003), já comentada no livro “Direito Sumular-STF”, Capítulo X (Direito Tributário e Processual Tributário).
A partir da sua publicação na imprensa oficial, a Súmula Vinculante 40 terá efeito vinculante em relação aos demais órgãos do Poder Judiciário e à Administração Pública direta e indireta, nas esferas federal, estadual e municipal.
Súmula Vinculante 41: O serviço de iluminação pública não pode ser remunerado mediante taxa. Aprovada pelo Plenário do STF em 11/03/2015.
A presente Súmula Vinculante reproduz exatamente o enunciado da Súmula 670 do STF (DJ 09/10/2003), já comentada no livro “Direito Sumular-STF”, Capítulo X (Direito Tributário e Processual Tributário).
A partir da sua publicação na imprensa oficial, a Súmula Vinculante 41 terá efeito vinculante em relação aos demais órgãos do Poder Judiciário e à Administração Pública direta e indireta, nas esferas federal, estadual e municipal.


[1] Cf. STF - Voto do Ministro Carlos Britto na ADI 1045 DF, Rel. Min. Marco Aurélio, Tribunal Pleno, DJe 10/06/2009












ATUALIZAÇÃO N.4: Nova Súmula 518 do STJ comentada

Súmula 518: “Para fins do artigo 105, III, a, da Constituição Federal, não é cabível recurso especial fundado em alegada violação de enunciado de súmula. Data: 26/02/2015
Recentemente, foi publicada a Súmula 518 do STJ para consolidar um entendimento já de longa data na Corte, qual seja, não cabe recurso especial fundado em alegação de violação de Súmula de tribunal, por não se enquadrar no conceito de lei federal previsto no art. 105, III, “a” da CF/88, verbis:
  • Art. 105. Compete ao Superior Tribunal de Justiça:(...)III - julgar, em recurso especial, as causas decididas, em única ou última instância, pelos Tribunais Regionais Federais ou pelos tribunais dos Estados, do Distrito Federal e Territórios, quando a decisão recorrida:a) contrariar tratado ou lei federal, ou negar-lhes vigência;
Ora, os enunciados de Súmula são apenas expressões sintetizadas de orientações reiteradamente assentadas pela Corte. Dessa forma, não cabe o recurso especial pela letra “a” do inciso III do art. 105 da CF/88 por alegação de ofensa à jurisprudência do STJ.
Conforme bem explicam os ilustres processualistas Fredie Didier JR e Leonardo José Carneiro da Cunha: [1]
“Na verdade, a jurisprudência firma orientação a respeito da interpretação a ser conferida a dispositivos legais. O que se permite é que, no recurso especial, se demonstre que o dispositivo foi interpretado pelo tribunal de origem diferentemente do STJ. Em outras palavras, a jurisprudência do STJ não foi seguida, exatamente porque determinado dispositivo foi interpretado diferentemente da orientação por ele ministrada. Logo, deve o recurso especial apontar violação ao respectivo dispositivo legal, e não à jurisprudência ou ao enunciado da Súmula do STJ”.
Cumpre então indagar: Para efeito de cabimento de recurso especial, qual é a abrangência do termo lei federal?
De acordo com a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, o termo lei federal engloba os seguintes diplomas: a) lei ordinária federal; b) lei complementar federal; c) lei delegada federal; d) decreto-lei federal; e) medida provisória federal; e f). decreto autônomo federal. [2]
A respeito desse último caso cumpre registrar que a Corte Especial do STJ já decidiu que “o termo lei federal, para fins de interposição do recurso especial, abrange também os decretos”. [3] Conforme destaca a ilustre Ministra Nancy Andrighi no EREsp 919274 RS:[4]
“Há que se ressaltar, por oportuno, que não é todo e qualquer decreto editado pelo Chefe do Poder Executivo que autoriza a interposição de recurso especial, mas tão somente os de caráter geral, abstrato, impessoal e obrigatório, por sua natureza de lei em sentido material, estando excluídos desse rol todos aqueles cujos efeitos sejam nitidamente concretos, como os que extinguem função ou cargo público vago (alínea “”b”” do inc. VI do art. 84 da CF) e os que declaram o imóvel de interesse social para fins de reforma agrária (2º do art. 182 da CF).” [5] (grifo nosso)
Nesse ponto, é preciso registrar que existe no Brasil uma grande controvérsia a respeito da possibilidade dos decretos autônomos - que podem ser ser definidos como aqueles que não se limitam a regulamentar uma lei anterior, sendo capazes de inovar na ordem jurídica, estabelecendo normas sobre matérias não disciplinadas em lei.
Para a parcela da doutrina e da jurisprudência que admite a existência dos decretos autônomos, estes encontrariam fundamento no art. 84, inc. VI da CF, na redação dada pela Emenda Constitucional n. 32/2001. Na esteira de outros autores, entendemos que a hipótese prevista no art. 84, VI, “a”, da CF constitui verdadeiro decreto autônomo, podendo introduzir normas gerais, abstratas e impessoais, ao passo que o art. 84, VI, “b”, da CF trata de um mero ato de defeitos concretos, pois nesse caso a competência do Presidente se limitará a extinguir cargos ou funções, quando vagos, não estabelecendo normas sobre a matéria. [6]
 



[1] Cf. DIDIER JR, Fredie; CUNHA, Leonardo José Carneiro da. Curso de Direito Processual Civil. Vol. 3, 11ª ed. São Paulo: Juspodivm, 2013, p. 329.
[2] Cf., nessa mesma linha, DIDIER JR, Fredie; CUNHA, Leonardo José Carneiro da. Curso de Direito Processual Civil. Vol. 3, 11ª ed. São Paulo: Juspodivm, 2013, p. 329.
[3] Cf. STJ - EREsp 663.562/RJ, Rel. Min. Ari Pargendler, Corte Especial, DJ de 18/02/2008).
[4] “(...) Conquanto o Decreto nº 2.040 /96 tenha sido editado com base no inc. IV do art. 84 da CF , caracterizando-se, em princípio, como ato normativo secundário, certo é que se trata de norma jurídica de caráter geral, abstrato, impessoal e obrigatório, que não possui cunho meramente regulamentador, mas cria deveres e concede direitos aos militares movimentados, se apresentando como verdadeira lei em sentido material, de sorte que deve ser enquadrado no conceito de “lei federal” para efeito de cabimento do recurso especial. (...)” STJ - EREsp 919274 RS, Rel. Min. Nancy Andrighi, Corte Especial, DJe 12/08/2013.
[5] Cf. STJ – Voto da Ministra Nancy Andrighi (Relatora), no EREsp 919274 RS, Corte Especial, DJe 12/08/2013
[6] Nessa mesma linha, DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo. 22. ed. São Paulo: Atlas, 2009, p. 91: “Nessa mesma linha, a ilustre Prof. Maria Sylvia Zanella Di Pietro afirma que: “no direito brasileiro, a Constituição de 1988 limitou consideravelmente o poder regulamentar, não deixando espaço para os regulamentos autônomos, a não ser a partir da Emenda Constitucional nº 32/01. (...) Com a alteração do dispositivo constitucional, fica restabelecido o regulamento autônomo no direito brasileiro, para a hipótese específica inserida na alínea a. A norma estabelece certo paralelismo com atribuições semelhantes da Câmara dos Deputados (art. 51, IV), do senado (art. 52, XIII) e dos Tribunais (art. 96, I, b).”














ATUALIZAÇÃO N.3: Novas Súmulas 517 e 519 do STJ comentadas


NOVAS SÚMULAS 517 E 519 DO STJ:
ENTENDA QUANDO E COMO INCIDEM HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS NO CUMPRIMENTO DE SENTENÇA

O presente artigo se destina a examinar as Súmulas ns. 517 e 519 do STJ, de modo a compatibilizar o comando dos enunciados e esclarecer seus fundamentos.
Publicados em março de 2015, os verbetes ganharam a seguinte redação:
  • Súmula 517: São devidos honorários advocatícios no cumprimento de sentença, haja ou não impugnação, depois de escoado o prazo para pagamento voluntário, que se inicia após a intimação do advogado da parte executada.
  • Súmula 519 STJ: Na hipótese de rejeição da impugnação ao cumprimento de sentença, não são cabíveis honorários advocatícios.
Sumário: 1. Considerações iniciais. 2. O sincretismo processual introduzido pela Lei Federal n. 11.232/2005. 3. Quais as razões que justificam a fixação de honorários advocatícios na fase de cumprimento de sentença? 3.1. A necessidade de se remunerar o advogado. 3.2. Cumprimento de sentença: uma execução que atrai o art. 20, § 4º, CPC. 3.3 Cumprimento de sentença: um incidente do processo. 3.4 O espírito das alterações pretendidas com a Lei n. 11.232⁄2005. 4. O critério de exigibilidade dos honorários advocatícios no cumprimento de sentença. 5. O Princípio da Causalidade. 6. Rejeição da impugnação ao cumprimento de sentença. Conclusão. Notas. Referências.
1. CONSIDERAÇÕES INICIAIS
Em 2005, com o advento da Lei n. 11.232, a execução de sentença deixa de ser um processo autônomo e passa a figurar apenas como uma fase do processo de conhecimento, chamada “cumprimento de sentença”, não havendo mais ação autônoma.
Entretanto, a Lei 11.232, vigente desde 23 de junho de 2006, nada diz sobre os honorários advocatícios nessa nova etapa processual. Em razão disso, muitos debates surgiram na doutrina e na jurisprudência a respeito da incidência ou não dos honorários advocatícios na fase de cumprimento de sentença. A discussão girava em torno da seguinte questão: há incidência de honorários advocatícios no cumprimento da sentença? Em caso positivo, como estes honorários devem incidir?
Instado a se manifestar, o Superior Tribunal de Justiça, a partir do julgamento do REsp 1.028.855 SC, pela Corte Especial, firmou o entendimento de que, na nova sistemática instituída pela Lei n. 11.232⁄2005, é cabível a condenação a honorários advocatícios na fase do cumprimento de sentença.
Sobre a matéria, a Corte publicou os verbetes sumulares n. 517 e 519, sobre os quais lançaremos nossos esforços, a fim compatibilizar o comando dos enunciados e esclarecer seus fundamentos.
2. O SINCRETISMO PROCESSUAL INTRODUZIDO PELA LEI FEDERAL N. 11.232/05
Com o advento da Lei Federal n. 11.232/2005, que alterou a execução de sentença, passou a viger em nosso sistema processual civil o chamado processo sincrético, ou seja, deixa de existir a divisão entre processo de conhecimento e processo de execução, como era antes.
Com a chegada dessa lei, portanto, a execução de sentença deixa de ser um procedimento autônomo e torna-se uma fase processual, figurando como uma mera continuidade do processo de conhecimento. Vale dizer, o antigo processo de execução foi substituído pela chamada “fase de cumprimento da sentença”, que flui nos próprios autos em que foi proferida a sentença, não mais sendo um processo autônomo. Assim, passa a existir apenas um processo, que se desenvolve desde a petição inicial (fase cognitiva), até a satisfação do credor (fase executiva).
Conforme explica o ilustre processualista Alexandre Freitas Câmara: [1]
“O que se fez foi transformar a execução de sentença em fase do mesmo processo em que o provimento jurisdicional é proferido. Deixa-se de falar no binômio processo de conhecimento – processo de execução e se passa a reconhecer a existência de um processo, misto, sincrético, e que desenvolvem duas fases distintas (conhecimento e execução).”
Em suma, com o advento da Lei Federal n. 11.232/05, passa a existir um procedimento sincrético ou misto, onde se desenvolvem ambas as atividades – executiva e cognitiva – num mesmo processo, não havendo, portanto, a formação de uma nova relação processual na fase de execução.[2]
Ocorre que a Lei n. 11.232⁄2005 nada disse sobre a incidência dos honorários advocatícios no cumprimento da sentença, razão pela qual muitas discussões se ergueram a respeito da incidência ou não de honorários advocatícios nessa nova etapa processual.
A partir do julgamento do REsp 1028855 SC[3], pela Corte Especial, o STJ firmou o entendimento de que, na nova sistemática processual civil instituída pela Lei n. 11.232⁄05, é cabível a condenação em honorários advocatícios na fase de cumprimento de sentença, como forma de remuneração do advogado em relação ao trabalho desenvolvido nessa etapa do processo.
Esta orientação da Corte Especial suplantou a divergência doutrinária antes existente[4], que havia inclusive angariado adesão da 1ª Turma do STJ, a qual chegou a afirmar que “não é cabível, por ausência de disposição legal, novos honorários advocatícios pelo fato de o exequente ser obrigado a requerer o cumprimento de sentença”. [5]
3. QUAIS AS RAZÕES QUE JUSTIFICAM A FIXAÇÃO DE HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS NA FASE DE CUMPRIMENTO DE SENTENÇA?
3.1. A NECESSIDADE DE SE REMUNERAR O ADVOGADO
Como vimos, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça já se firmou no sentido do cabimento da condenação a honorários advocatícios no estágio da execução denominado “cumprimento de sentença”, mesmo diante da omissão legislativa da Lei 11.382⁄2005.
Esta orientação justifica-se na necessidade de se remunerar o advogado pela prática de atos processuais necessários à promoção ou à impugnação da pretensão executiva. Do contrário, o advogado trabalhará sem ser assegurado o recebimento da respectiva contraprestação pelo serviço prestado, caracterizando inclusive ofensa ao art. 22 da Lei n. 8.906⁄94 – Estatuto da Advocacia, que garante ao causídico a percepção dos honorários de sucumbência.
Ora, vale lembrar que a verba honorária fixada na fase de cognição leva em consideração apenas o trabalho realizado pelo advogado até então - ou seja, até o trânsito em julgado da decisão que constitui o título executivo. E nem poderia ser diferente, já que, naquele instante, sequer se sabe se o sucumbente irá cumprir espontaneamente a sentença ou se irá opor resistência.[6]
Para fins de incidência dos honorários na fase de cumprimento da sentença, é necessário que o advogado do devedor tenha impetrado impugnação à execução?
Segundo o STJ, tendo em vista que o art. 475-I do CPC dispõe que “o cumprimento de sentença se faz por execução” e que o art. 20, § 4º do CPC, por sua vez, prevê que “os honorários serão fixados nas execuções embargadas ou não”, revela-se evidente que são cabíveis honorários advocatícios no cumprimento de sentença, não importando se houve ou não impugnação do executado.
Nesse mesmo sentido, o ilustre processualista Nelson Nery Júnior[7] assim expôs:
“A incidência dos honorários ocorre pelo simples fato de haver execução de sentença, ainda que não impugnada ou embargada. Nos casos de cumprimento da sentença, nos termos do CPC 475-I a 475-R (Capítulo X – Título VIII, Livro I, incluído pela Lei 11232, de 22.12.2005, DOU 23.12.2005, em vigor após seis meses da data de sua publicação), além da multa de 10% sobre o valor da condenação, prevista para a hipótese de não cumprimento imediato da sentença transitada em julgado  (CPC 475-J), são devidos honorários de advogado. (...)”.
3.2. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA: UMA EXECUÇÃO QUE ATRAI O ART. 20, § 4º, CPC
Como ressaltou Alexandre Freitas Câmara:[8]
“o fato de se ter alterado a natureza da execução de sentença, que deixou de ser tratada como processo autônomo e passou a ser mera fase complementar do mesmo processo em que aquele provimento é proferido, não traz nenhuma modificação no que diz respeito aos honorários advocatícios (...). A ideia de que havendo um só processo só pode haver uma fixação de verba honorária foi construída em uma época em que o Código de Processo Civil albergava o modelo liebmaniano da separação entre o processo de conhecimento e o processo executivo, e não pode ser simplesmente transplantada para os dias atuais como se nada tivesse mudado no CPC”.
Conforme observou o ilustre processualista Alexandre Freitas Câmara, “não há no texto da lei referência aos “processos de execução”, mas às “execuções”. Induvidoso, portanto, que existindo execução, deverá então haver a fixação de honorários, independentemente do oferecimento de impugnação.
Na mesma linha, o renomado Barbosa Moreira assim expôs:[9]
“Raiaria pelo absurdo, note-se, pensar que a Lei n.º 11.232 pura e simplesmente ‘aboliu a execução’. O que ela aboliu, dentro de certos limites, foi a necessidade de instaurar-se novo processo, formalmente diferenciado, após o julgamento da causa, para dar efetividade à sentença - em linguagem carneluttiana, para fazer que realmente seja aquilo que deve ser, de acordo com o teor do pronunciamento judicial”.
De fato, “execução” é espécie de tutela judicial (e não de processo), sendo certo que a atividade estatal levada a efeito após a sentença - quer se instaure um processo autônomo, quer se desenrole de forma continuada à tutela anterior - não deixa de ser execução. [10]
Numa palavra: essa característica do cumprimento de sentença, qual seja, a de se tratar de verdadeira execução, é o bastante para fazer incidir o art. 20, § 4º, do CPC, porquanto tal dispositivo não se refere a “processo de execução”, mas a “execução” apenas.
Conforme afirmou a ilustre Ministra Nancy Andrighi, “a própria interpretação literal do art. 20, § 4º, do CPC não deixa margem para dúvidas. Consoante expressa dicção do referido dispositivo legal, os honorários são devidos “nas execuções, embargadas ou não”. Confira:
  • CPC. Art. 20. A sentença condenará o vencido a pagar ao vencedor as despesas que antecipou e os honorários advocatícios. Esta verba honorária será devida, também, nos casos em que o advogado funcionar em causa própria. (...)§ 4º Nas causas de pequeno valor, nas de valor inestimável, naquelas em que não houver condenação ou for vencida a Fazenda Pública, e nas execuções, embargadas ou não, os honorários serão fixados consoante apreciação eqüitativa do juiz, atendidas as normas das alíneas a, b e c do parágrafo anterior. (grifo nosso)
Nessa mesma linha, a Corte Especial do STJ, no julgamento do EREsp 158884 RS (DJ 30/04/2001), já havia afirmando expressamente que a redação do art. 20, § 4º, do CPC, “deixa induvidoso o cabimento de honorários de advogado em execução mesmo não embargada, não fazendo a lei, para esse fim, distinção entre execução fundada em título judicial ou execução fundada em título extrajudicial”.[11]
Confrontando esse precedente com as inovações da Lei n. 11.232⁄05, o ilustre Ministro Athos Gusmão Carneiro já havia ressaltado que “esta orientação jurisprudencial permanece mesmo sob a nova sistemática de cumprimento da sentença, porquanto irrelevante, sob este aspecto, que a execução passe a ser realizada em fase do mesmo processo, e não mais em processo autônomo”.[12]
3.3 CUMPRIMENTO DE SENTENÇA: UM INCIDENTE PROCESSUAL
Conforme dispõe o ilustre doutrinador Nelson Nery Jr:[13]
“A execução de título judicial por quantia certa contra devedor solvente não mais existe no sistema processual civil brasileiro, porquanto foi substituída pelo instituto do cumprimento da sentença, regulado no CPC 475-I a 475-R.”
Ao discorrer sobre os argumentos favoráveis ao arbitramento de honorários na fase de cumprimento da sentença, a ilustre Ministra Nancy Andrighi destacou que “o fato da execução agora ser um mero “incidente” do processo não impede a condenação em honorários, como, aliás, ocorre em sede de exceção de pré-executividade, na qual esta Corte admite a incidência da verba. [14]
Em outras palavras, o fato da Lei n. 11.232⁄2005 ter extinguido o processo autônomo de execução de sentença, transformando-o no incidente de cumprimento de sentença, não impede a condenação em honorários.
3.4 O ESPÍRITO DAS ALTERAÇÕES PRETENDIDAS COM A LEI N. 11.232⁄2005
Examinando os motivos que justificam o cabimento dos honorários advocatícios no cumprimento de sentença, a ilustre Ministra Nancy Andrighi deu especial atenção ao espírito condutor das alterações pretendidas com a Lei n. 11.232⁄2005, em especial a multa de 10% prevista no art. 475-J do CPC.
Conforme observa Cássio Scarpinella Bueno, “este acréscimo monetário no valor da dívida, aposta o legislador, tem o condão de incentivar o devedor a pagar de uma vez, acatando a determinação judicial”. [15]
De acordo com a ilustre Ministra Nancy Andrighi:
“(...) Realmente, a segunda onda de reformas do CPC⁄1973, a chamada “reforma de reforma”, foi centrada no processo de execução, tendo como objetivo maior a busca por resultados, tornando a prestação jurisdicional mais célere e menos burocrática, antecipando a satisfação do direito reconhecido na sentença.Nesse contexto, seria inútil a instituição da multa do art. 475-J do CPC se, em contrapartida, fosse abolida a condenação em honorários, arbitrada no percentual de 10% a 20% sobre o valor da condenação.Como, nas circunstâncias em questão, para o devedor é indiferente saber a quem paga, a multa do art. 475-J do CPC perderia totalmente sua força coativa e a nova sistemática impressa pela Lei nº 11.232⁄05 não surtiria os efeitos pretendidos, já que não haveria nenhuma motivação complementar para o cumprimento voluntário da sentença. Ao contrário, as novas regras viriam em benefício do devedor que, se antes ficava sujeito a uma condenação em honorários que poderia alcançar os 20%, com a exclusão dessa verba, estaria agora adstrito tão-somente a uma multa no percentual fixo de 10%.Por todos esses motivos, deve o juiz, independentemente do oferecimento de impugnação, fixar verba honorária na fase de cumprimento da sentença, nos termos do art. 20, § 4º, do CPC. (...)”
4. A EXIGIBILIDADE DOS HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS NO CUMPRIMENTO DE SENTENÇA
Conforme vimos no item 3.1, a jurisprudência do STJ se firmou no sentido da possibilidade da condenação em honorários advocatícios na fase de cumprimento de sentença, haja ou não oferecimento de impugnação por parte do devedor executado.
Cumpre então questionar: a partir de que momento incidem os honorários advocatícios no cumprimento de sentença?
De acordo com o Superior Tribunal de Justiça, embora os honorários advocatícios possam ser fixados para a fase de cumprimento de sentença, a sua exigibilidade só é possível se o devedor não efetuar o pagamento ou o depósito do montante da condenação no prazo de 15 dias previsto no artigo 475-J do CPC, que somente começa a correr após a intimação do advogado do devedor.[16]
Este entendimento foi consolidado na recente Súmula 517 do STF, verbis:
  • Súmula 517: São devidos honorários advocatícios no cumprimento de sentença, haja ou não impugnação, depois de escoado o prazo para pagamento voluntário, que se inicia após a intimação do advogado da parte executada.
Diante do exposto, verifica-se que foram solucionados dois pontos fundamentais, a saber:
a) O termo de início do prazo previsto no artigo 475-J do CPC é a intimação do devedor
O STJ considerou que é necessária a intimação do advogado do executado para que não possa pairar dúvidas acerca da data do trânsito em julgado e também quanto ao valor atualizado da dívida, já que, em muitos casos, exige-se memorial de cálculos a ser apresentado pelo credor. Assim, somente após o prazo de 15 dias contados da intimação do devedor, na pessoa do seu advogado, pode-se falar em não cumprimento espontâneo da obrigação, caso o devedor, intimado, deixe de efetuar o pagamento. [17]
b) A exigibilidade dos honorários advocatícios no cumprimento de sentença ó é possível se o devedor não efetuar o pagamento no prazo do art. 475-J do CPC.
Vale dizer, com o advento da Lei n. 11.232⁄05, a incidência de novos honorários (relativos à fase de cumprimento da sentença) pressupõe o esgotamento do prazo legal para o cumprimento espontâneo da condenação. Isso porque, sem que esse prazo se escoe, não há necessidade de praticar quaisquer atos jurisdicionais.
Este entendimento se estriba no princípio da causalidade, pelo qual quem deu causa ao aforamento da demanda é que deve responder pelo pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios. Ou seja, arcará com as verbas de advogado quem deu causa à lide, deduzindo pretensão ilegítima ou resistindo a pretensão legítima.
Dessa forma, se escoado o prazo de 15 dias previsto no art. 475-J do CPC sem pagamento voluntário da condenação, o devedor dará causa à instalação da nova fase (execução), devendo portanto incidir o pagamento também de novos honorários a serem fixados de acordo com o art. 20, § 4º, do CPC.
Cabe destacar que, obviamente, não se exigem honorários advocatícios se não há resistência no cumprimento da decisão judicial, isto é, quando o devedor paga espontaneamente o montante da condenação dentro do prazo de 15 dias previsto no artigo 475-J do CPC. [18]
Isso porque, segundo o STJ, “no caso de pagamento espontâneo do devedor que, intimado, adimple a obrigação dentro dos 15 dias previstos no art. 475-J do CPC, fica descaracterizada a resistência ao cumprimento da sentença, sendo desnecessário trabalho advocatício que resulte na condenação em honorários”. [19]
5. O PRINCÍPIO DA CAUSALIDADE
Como vimos no item anterior, é cabível a condenação a honorários advocatícios no estágio da execução denominado cumprimento de sentença, cuja exigibilidade condiciona-se à ausência de tempestivo pagamento do débito no prazo de 15 dias previsto no art. 475-J do CPC.
Este entendimento se estriba no princípio da causalidade, pelo qual arcará com as verbas de advogado quem deu causa à lide, deduzindo pretensão ilegítima ou resistindo a pretensão legítima.
Nesse sentido, a causalidade está intimamente relacionada com a evitabilidade do litígio:
“O direito do titular deve remanescer incólume à demanda, e a obrigação de indenizar deve recair sobre [quem] deu causa à lide por um fato especial, ou sem um interesse próprio contrário ao interesse do vencedor, seja pelo simples fato de que o vencido é sujeito de um interesse oposto àquele do vencedor. O que é necessário, em todo caso, é que a lide “fosse evitable” da parte do sucumbente (o que sempre se subentende, sem qualquer consideração à culpa). E esta evitabilidade poderá consistir seja no abster-se do ato a que a lide é dirigida, seja no adaptar-se efetivamente à demanda, seja em não ingressar na demanda mesma (CAHALI, Yussef Said. Honorários advocatícios. 2 ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 1990, p. 36).
Nesse passo, mostra-se consentânea com o princípio da causalidade a fixação de honorários no cumprimento da sentença, porquanto a inércia do vencido deu causa à instalação de um novo procedimento executório, muito embora nos mesmos autos.[20]
6. Rejeição da impugnação ao cumprimento de sentença
O STJ firmou sua jurisprudência no sentido de que honorários advocatícios são devidos no cumprimento de sentença nas situações em que o devedor optou por não efetuar o pagamento dentro dos 15 dias estipulados no art. 475-J do CPC, e resolveu impugnar ou continuar obstando o cumprimento do julgado, implicando necessidade de participação nos autos de advogado do exequente, agora também nesse momento processual. [21]
Imagine-se, então, que o devedor executado decidiu deixar escoar o prazo de 15 dias para pagamento espontâneo e ofereceu impugnação (defesa típica do executado).
Cumpre indagar: Se esta impugnação oferecida pelo devedor for posteriormente julgada improcedente, o devedor deverá arcar com novos honorários advocatícios (além daqueles que ele já deve pagar pelo fato do cumprimento de sentença ter sido deflagrado)?
Segundo o STJ, na hipótese de rejeição da impugnação ao cumprimento de sentença, não são cabíveis novos honorários advocatícios. Ou seja, o devedor não terá que pagar novos honorários advocatícios pelo fato da sua impugnação ter sido rejeitada. Neste caso, ele deverá arcar apenas com os honorários advocatícios decorrentes da deflagração do cumprimento de sentença.
Conforme explicou o ilustre Ministro Luis Felipe Salomão: “aviando o executado a sua impugnação, restando vencido a final, não se vislumbra nisso causa de instalação de nenhum outro procedimento novo, além daquele já aperfeiçoado com o pedido de cumprimento de sentença”.[22]
Esta orientação culminou na edição da Súmula 519 do STJ, verbis:
  • Súmula 519: “Na hipótese de rejeição da impugnação ao cumprimento de sentença, não são cabíveis honorários advocatícios”.
Ora, apenas no caso de acolhimento da impugnação, ainda que parcial, serão arbitrados honorários em benefício do executado, com base no art. 20, § 4º, do CPC.
Ressalte-se que em caso de acolhimento total da impugnação, com extinção do feito mediante sentença (art. 475-M, § 3º), revela-se que quem deu causa ao procedimento de cumprimento de sentença foi o exequente, devendo ele arcar com as verbas advocatícias. Em outras palavras: os honorários em favor do exequente deixam de existir em caso de acolhimento total da impugnação, com extinção do procedimento executório, ocasião em que serão arbitrados honorários únicos ao impugnante. [23]
Sobre a matéria, confira o julgado a seguir transcrito:
AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL CIVIL. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. IMPUGNAÇÃO. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. MULTA DO ART. 538 DO CPC. VIOLAÇÃO AO ART. 535 DO CPC.1. São cabíveis honorários advocatícios em fase de cumprimento de sentença, depois de escoado o prazo para pagamento voluntário (art. 475-J do CPC), que somente se inicia após a intimação do advogado, com a baixa dos autos e a aposição do “cumpra-se”.2. Impugnada a execução e sendo esta acolhida, ainda que parcialmente, serão arbitrados honorários em benefício do executado, com base no art. 20, § 4º, do CPC (REsp 1.134.186⁄RS).3. Os honorários fixados no início ou em momento posterior da fase executiva, em favor do exequente, deixam de existir em caso de acolhimento total da impugnação ou exceção de pré-executividade, com extinção do procedimento executório, ocasião em que serão arbitrados honorários únicos ao impugnante. Por outro lado, caso seja rejeitada a impugnação, somente os honorários fixados no procedimento executório subsistirão.4. Inviável a aplicação da multa prevista no artigo 538 do Código de Processo Civil, parágrafo único, quando os embargos declaratórios não possuem intento procrastinatório.5. Não se viabiliza o recurso especial pela indicada violação do artigo 535 do Código de Processo Civil, quando a matéria em exame foi devidamente enfrentada pelo Tribunal de origem.6. Agravo regimental não provido.(AgRg no REsp 1.170.599⁄RS, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, Quarta Turma, j. 24⁄9⁄2013, DJe 2⁄10⁄2013)
CONCLUSÃO
A Lei n. 11.232/2005, que fez com que a execução de sentença deixasse de ser um processo autônomo para figurar apenas como uma fase do processo de conhecimento, chamada cumprimento de sentença, nada disse sobre os honorários advocatícios nessa nova etapa processual. Apesar da omissão legislativa, a jurisprudência do STJ se firmou no sentido de que é cabível a condenação em honorários advocatícios na fase de cumprimento de sentença, mesmo após a nova sistemática instituída pela Lei n. 11.232⁄05.
Dentre os fundamentos que sustentam esta orientação, destacam-se os seguintes: a) A necessidade de se remunerar o advogado em relação ao trabalho desenvolvido nessa etapa do processo; b) O fato do cumprimento de sentença se tratar de verdadeira execução, justificando a incidência do art. 20, § 4º, do CPC, pois tal dispositivo não se refere a “processo de execução”, mas a “execução” apenas; c) O fato da execução agora ser um mero “incidente” do processo não impede a condenação em honorários, como, aliás, ocorre em sede de exceção de pré-executividade, na qual o STH admite a incidência da verba; e d) A reforma legislativa, ao alterar o processo de execução, buscou a prestação jurisdicional mais célere, antecipando a satisfação do direito reconhecido na sentença. Portanto, seria inútil a instituição da multa do art. 475-J do CPC se, em contrapartida, fosse abolida a condenação em honorários, arbitrada no percentual de 10% a 20% sobre o valor da condenação.
Sendo certo que os honorários advocatícios podem ser fixados para a fase de cumprimento de sentença, o STJ fixou as seguintes regras:
1) A exigibilidade dos honorários advocatícios na fase de cumprimento de sentença condiciona-se à ausência de tempestivo pagamento do débito no prazo de 15 dias previsto no art. 475-J do CPC, que começa a correr após a intimação do advogado do devedor. Este entendimento se estriba no princípio da causalidade.
2) Para fins de incidência dos honorários na fase de cumprimento da sentença, não é necessário que o advogado do devedor executado tenha impetrado impugnação à execução. Ora, o art. 475-I do CPC dispõe que “o cumprimento de sentença se faz por execução” enquanto o art. 20, § 4º do CPC prevê que “os honorários serão fixados nas execuções embargadas ou não”, revelando-se portanto evidente que são cabíveis honorários advocatícios no cumprimento de sentença, não importando se houve ou não impugnação do executado.
Vale dizer: a incidência dos honorários ocorre pelo simples fato de haver execução de sentença, não importando se houve ou não impugnação do executado.
Este entendimento foi fixado na Súmula 517 do STF, verbis: “São devidos honorários advocatícios no cumprimento de sentença, haja ou não impugnação, depois de escoado o prazo para pagamento voluntário, que se inicia após a intimação do advogado da parte executada”.
Porém, existem casos em que o devedor opta por não efetuar o pagamento dentro do prazo de 15 dias para pagamento espontâneo, e resolve oferecer impugnação ao cumprimento de sentença. Neste caso, incidirão honorários advocatícios? Sobre o tema, o STJ distinguiu as seguintes situações:
a) Se a impugnação é rejeitada: O executado não terá que pagar novos honorários, devendo arcar apenas com os honorários decorrentes da deflagração do cumprimento de sentença. Nesse sentido é a Súmula 519 do STJ (“Na hipótese de rejeição da impugnação ao cumprimento de sentença, não são cabíveis honorários advocatícios”.)
b) Se a impugnação é acolhida: No caso de acolhimento da impugnação, ainda que parcial, serão arbitrados honorários em benefício do executado, com base no art. 20 , § 4º , do CPC. Ressalte-se que, se houver acolhimento total da impugnação, com extinção do feito mediante sentença (art. 475-M, § 3º), os honorários em favor do exequente deixam de existir, sendo arbitrados honorários únicos ao executado - nesse caso, fica claro que quem deu causa ao procedimento de cumprimento de sentença foi o exequente, devendo ele arcar com as verbas advocatícias.
REFERÊNCIAS
BUENO. Cássio Scarpinella Bueno. A Nova Etapa da Reforma do Código de Processo Civil. São Paulo: Saraiva, 2006, 2ª ed. p. 83.
CÂMARA, Alexandre Freitas. A nova execução de sentença. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2009, p.9.
————. A Nova Execução de Sentença. Rio de Janeiro: Editora Lumen Juris, 2007, 3ª ed., p. 122-123.
CARNEIRO. Athos Gusmão. Cumprimento da Sentença Cível. Rio de Janeiro: Forense, 2007, p. 108.
MOREIRA. José Carlos. Cumprimento e Execução de Sentença: Necessidade de Esclarecimentos
Conceituais. In. Revista Dialética de direito Processual, n.º 42, p. 56.
NERY JUNIOR, Nelson. NERY, Rosa Maria de Andrade. Código de Processo Civil Comentado e Legislação Extravagante: Atualizado até 1.º de março de 2006. 9ª ed. rev., atual.e ampl. São Paulo: Editora Revisa dos Tribunais, 2006, p. 640.
THEODORO JÚNIOR, Humberto. As Novas Reformas do Código de Processo Civil, Editora Forense, 1ª Edição, p. 139.
 
Alice Saldanha Villar
Advogada e autora dos livros “Direito Sumular - STF” e Direito Sumular - STJ”, Editora JHMIZUNO, São Paulo, 2015 - Prefácio do Ministro Luiz Fux.


[1] Cf. CÂMARA, Alexandre Freitas. A nova execução de sentença. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2009, p.9.
[2] Com isso, passou a existir um sistema dual de execuções. Conforme explicou o ilustre Ministro “(...) se é certo se dizer que, no caso de cumprimento de sentença, foi abolida a necessidade de instauração de um novo processo, devendo a execução se dar nos autos da própria ação que deu origem ao título, observa-se que, no caso dos incisos II, IV e VI do artigo 475-N, na execução contra a Fazenda Pública, e na execução dos títulos executivos extrajudiciais, instaurar-se-á um processo executivo autônomo, caso não haja o cumprimento voluntário da obrigação contida no título”.
[3] Cf. STJ - REsp 1028855 SC, Rel. Min. Nancy Andrighi, Corte Especial, DJe 05/03/2009.
[4] Cf. THEODORO JÚNIOR, Humberto. As Novas Reformas do Código de Processo Civil, Editora Forense, 1ª Edição, p. 139: “As despesas processuais do cumprimento de sentença, naturalmente, correm por conta do executado, como consectário do inadimplemento. Não há, porém, como imputar-lhe nova verba advocatícia, uma vez que não há mais uma ação distinta para executar a sentença. Tudo se passa sumariamente como simples fase do procedimento condenatório. E, sendo mero estágio do processo já existente, não se lhe aplica a sanção do art. 20, mesmo quando se verifique o incidente da impugnação (art. 475-L). Sujeita-se este à mera decisão interlocutória (art. 475-M, § 3º), situação a que não se amolda a regra sucumbencial do art. 20, cuja aplicação sempre pressupõe sentença”.
[5] Cf. STJ - REsp 1025449 RS, Rel. Min. Hamilton Carvalhido, 1ª Turma, DJe 22/06/2009.
[6] Cf., destre tantos outros: STJ - AgRg no REsp 1198098 SP, Re. Min. PAULO DE TARSO SANSEVERINO, 3ª Turma, DJe 27/08/2012.
[7] Cf. NERY JUNIOR, Nelson. NERY, Rosa Maria de Andrade. Código de Processo Civil Comentado e Legislação Extravagante: Atualizado até 1.º de março de 2006. 9ª ed. rev., atual.e ampl. São Paulo: Editora Revisa dos Tribunais, 2006, p. 694.
[8] Cf. CÂMARA, Alexandre Freitas. A Nova Execução de Sentença. Rio de Janeiro: Editora Lumen Juris, 2007, 3ª ed., p. 122-123 – Citado no voto da Ministra Nacy Andrighi no REsp 1028855 SC, Rel. Min. NANCY ANDRIGH, Corte Especial, DJe 05/03/2009.
[9] Cf. MOREIRA. José Carlos. Cumprimento e Execução de Sentença: Necessidade de Esclarecimentos Conceituais. In. Revista Dialética de direito Processual, n.º 42, p. 56.
[10] Cf. STJ – Voto do Ministro LuisFelipe Salomão no REsp 664078 SP, Rel. Min. Luiz Felipe Salomão, 4ª Turma, DJe 29/04/2011.
[11] Cf. STJ - EREsp 158884 RS, Rel. Min. Demócrito Reinaldo, Rel. p⁄ acórdão Min. Humberto Gomes de Barros, DJ 30/04/2001.
[12] Cf. CARNEIRO. Athos Gusmão. Cumprimento da Sentença Cível. Rio de Janeiro: Forense, 2007, p. 108 - Citado no voto da Ministra Nacy Andrighi no REsp 1028855 SC, Rel. Min. NANCY ANDRIGH, Corte Especial, DJe 05/03/2009.
[13] Cf. NERY JUNIOR, Nelson. NERY, Rosa Maria de Andrade. Código de Processo Civil Comentado e Legislação Extravagante: Atualizado até 1.º de março de 2006. 9ª ed. rev., atual.e ampl. São Paulo: Editora Revisa dos Tribunais, 2006, p. 640.
[14] Confira-se, nesse sentido, os seguintes precedentes: REsp 1028855 SC, Rel. Min. NANCY ANDRIGH, Corte Especial, DJe 05/03/2009; REsp 737767 AL, 3ª Turma, Rel. Min. Castro Filho, Rel. p⁄ acórdão Min. Humberto Gomes de Barros, DJ 22/05/2006; REsp 751400 MG, 3ª Turma, Rel. Min. Ari Pargendler, DJ de 19.12.2005; e AgRg no REsp 631478 MG, 3ª Turma, Re. Min. Nancy Andrighi, DJ 13/09/2004.
[15] Cf. BUENO. Cássio Scarpinella Bueno. A Nova Etapa da Reforma do Código de Processo Civil. São Paulo: Saraiva, 2006, 2ª ed. p. 83.
[16] Cf. STJ - REsp 1134186 RS, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, Corte Especial, DJe 21/10/2011.
[17] Cf. STJ - REsp 1134186 RS, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, Corte Especial, DJe 21/10/2011; REsp 1134186 RS, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, Corte Especial, DJe 21/10/2011.
[18] Cf. dentre outros: STJ - REsp 1.084.484⁄SP, Rel. Ministra Eliana Calmon, 2ª Turma, DJe 21⁄08⁄2009.
[19] Cf. STJ - AgRg no REsp 1131083 PR, Rel. Ministro Herman Benjamin, 2ª Turma, DJe 09⁄10⁄2009.
[20] Cf. STJ – Voto do Ministro Luis Felipe Salomão (Relator) no REsp 1134186 RS, Corte Especial, DJe 21/10/2011.
[21] Cf. STJ - Voto do Ministro Massami Uyeda (Relator) no AgRg no AREsp 42719 PR, 3ª Turma, DJe 12/12/2011.
[22] Cf. STJ – Voto do Ministro Luis Felipe Salomão (Relator), no AgRg no REsp 1170599 RS, 4ª Turma, DJe 02/10/2013.
[23] Cf. AgRg no REsp 1170599 RS, Rel. Ministro Luis Felipe Salomão, 4ª Turma,, DJe 2⁄10⁄2013; STJ - REsp 1134186 RS, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, Corte Especial, DJe 21/10/2011.





















































































































ATUALIZAÇÃO N.2: Nova Súmula 516 do STJ comentada


A LEGITIMIDADE DA CIDE DESTINADA AO INCRA: ENTENDA O COMANDO DA NOVA SÚMULA 516 DO STJ
O presente artigo se destina ao exame do comando da Súmula 516 do STJ, publicada no dia 25 de fevereiro de 2015 com a seguinte redação:
  • Súmula 516/STJ: A contribuição de intervenção no domínio econômico para o Incra (Decreto-Lei n. 1.110/1970), devida por empregadores rurais e urbanos, não foi extinta pelas Leis ns. 7.787/1989, 8.212/1991 e 8.213/1991, não podendo ser compensada com a contribuição ao INSS.
Resumo: Em 2014, depois de muitos anos de debates e controvérsias, a 1ª Seção do Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do REsp 977058 RS, em conformidade com a jurisprudência do STF, assentou o entendimento de que a contribuição ao Incra, que se destina aos programas e projetos vinculados à reforma agrária e suas atividades complementares, possui natureza jurídica de CIDE e continua em vigor até os dias atuais, pois não foi revogada pela Lei 7.787/89, tampouco pelas Leis ns. 8.212/91 e 8.213/91. O presente artigo foi elaborado com o intuito de esclarecer os fundamentos dessa decisão, que deu origem à publicação do enunciado sumular n. 516 do STJ.
Palavras-chaves: INCRA, Contribuição ao Incra, Referibilidade direta.
Sumário: 1. O INCRA; 2. A contribuição destinada ao INCRA; 3. A não revogação da contribuição destinada ao INCRA pelas leis ns. Lei n.7.787⁄89, 8.212/91 e 8.213/91. 4. A impossibilidade de compensação da contribuição ao INCRA com a contribuição ao INSS. 5. A natureza jurídica da contribuição ao INCRA. 6. A constitucionalidade da contribuição ao INCRA. 7. A referibilidade direta é elemento constitutivo das CIDE’s?. Conclusão. Notas.
1. O INCRA
O Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA), criado pelo DL nº 1.110/1970, é uma autarquia federal vinculada ao Ministério da Agricultura. De acordo com a lei que o criou, sua missão é  executar a política de reforma agrária e realizar o ordenamento fundiário nacional, contribuindo para o desenvolvimento rural sustentável.
2. A contribuição ao INCRA
Visando atender essas finalidades, era necessário encontrar uma fonte de custeio, que veio a ser suprida com a instituição da contribuição para o INCRA pela Lei n. 2.163/55. Para a definição do custeio dessa contribuição, o DL n. 1.146/70 estabeleceu que seria destinada metade da contribuição criada pelo parágrafo 4º., art.6º, da Lei n. 2.613/55, ou seja, 0,2%.
Dessa forma, a contribuição para o INCRA corresponde a 0,2% sobre a folha salarial. Esta contribuição deve ser paga pelas empresas de todos os segmentos da economia – abrangendo, portanto, empresas rurais e urbanas.
3. A não revogação da contribuição ao INCRA pelas leis ns. Lei n.7.787⁄89, 8.212/91 e 8.213/91
Ocorre que, no ano de 1989 foi publicada a Lei n.7.787⁄89, que dispôs sobre alterações na legislação de custeio da Previdência Social. Essa lei, ao instituir/unificar a contribuição previdenciária das empresas (art. 3, inc. I - alíquota de 20%), suprimiu a contribuição ao PRORURAL (administrada pelo FUNRURAL).
Tendo em vista que a contribuição ao PRORURAL era prevista no mesmo dispositivo que a contribuição ao INCRA (art. 15, da LC 11/71), levantaram-se vozes sustentando que a Lei n.7.787/89 teria revogado a contribuição destinada ao INCRA. Com base nesse argumento, começaram a surgir muitas ações judiciais buscando a declaração de inexigibilidade de contribuição social destinada ao INCRA, de par com a compensação das parcelas recolhidas indevidamente com as parcelas vincendas a serem arrecadadas pelo INSS.
Neste cenário, o STJ foi instado a se manifestar a respeito de duas questões:
a) a contribuição de 0,2% devida ao INCRA teria sido extinta pela Lei n. 7.787/89?
b) Seria possível a compensação de parcelas recolhidas indevidamente a título de contribuição ao INCRA com parcelas vincendas a serem arrecadadas pelo INSS?
Em 2014, depois de muitos anos de debates e controvérsias, a 1ª Seção do Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do REsp 977058 RS, em conformidade com a jurisprudência do STF, assentou o seguinte entendimento: a contribuição ao Incra, que se destina aos programas e projetos vinculados à reforma agrária e suas atividades complementares, foi recepcionada pela CF/88 e continua em vigor até os dias atuais, pois não foi revogada pela Lei 7.787/89, tampouco pelas Leis ns. 8.212/91 e 8.213/91. Este entendimento culmonou na publicação da Súmula 516 do STJ, em fevereiro de 2015.
Conforme explicou o ilustre Des. Federal Antônio Ezequiel da Silva:[1]
“(...) a Lei n. 7.787/89, ao instituir/unificar a contribuição previdenciária das empresas (art. 3, I - alíquota de 20%), suprimiu somente a contribuição ao PRORURAL (administrada pelo FUNRURAL), não tratando, todavia, da contribuição ao INCRA.
As Leis nº 8.212/91 e 8.213/91 não atinam com a contribuição ao INCRA. A superveniência da segunda, aliás, induziu apenas a extinção da contribuição ao FUNRURAL sobre a comercialização de produtos rurais. (...) Alguns Tribunais, embora entendendo que a contribuição é devida por empresas urbanas, concluem, de maneira equivocada (e o emaranhado legislativo a tal pode mesmo induzir), que a Lei nº 7.787/89 suprimiu também a contribuição ao INCRA (0,2%), tal decorrendo fundamentalmente (falsa premissa) de se vislumbrar perfil previdenciário (que não há) na contribuição ao INCRA, daí concluindo pela sua exigência “em face princípio da solidarização da seguridade social”, traçando-se, ademais, indevida simbiose com o FUNRURAL (contribuição que - caminhando ao lado da INCRA - jamais com ela se identificou).”
Em suma: o STJ fixou o entendimento de que a contribuição para o INCRA não se confunde com a contribuição para o FUNRURAL, pois não se trata de contribuição da seguridade social.[2] Sendo assim, a contribuição para o INCRA não foi revogada pela Lei n. 7.787/89, tampouco pelas Leis n. 8.212/91 e 8.213/91. Segundo o STJ, a contribuição ao INCRA possui natureza jurídica de contribuição especial de intervenção no domínio econômico (CIDE), com fulcro no art. 149 da CF/88.[3]
4. A IMPOSSIBILIDADE DE COMPENSAÇÃO DA CONTRIBUIÇÃO AO INCRA COM A CONTRIBUIÇÃO AO INSS
Tendo em vista que a contribuição ao INCRA consiste numa contribuição de intervenção de domínio econômico (CIDE), então é evidente que valores recolhidos indevidamente a título de contribuição ao INCRA não podem ser compensados com outras contribuições arrecadadas pelo INSS que se destinam ao custeio da Seguridade Social. Vale frisar: trata-se de tributos distintos e, portanto, não compensáveis entre si.
Vale lembrar que o encontro de contas só pode ser efetuado com prestações vincendas da mesma espécie, ou seja, destinadas ao mesmo orçamento. Não se aplica, portanto, o § 1º do art. 66 da Lei n. 8.383/91 - que permite a compensação entre tributos e contribuições distintas, desde que sejam da mesma espécie e apresentem a mesma destinação orçamentária. [4]
À luz do que foi até agora exposto, observe que, por ocasião do julgamento do REsp 977058 RS, o STJ se posicionou a respeito de dois pontos fundamentais: a natureza jurídica e a constitucionalidade dessa contribuição de 0,2% destinada ao INCRA. Passemos agora à análise cuidadosa de cada um desses pontos.
5. A NATUREZA JURÍDICA DA CONTRIBUIÇÃO AO INCRA
De acordo com a jurisprudência do STJ, a Política Agrária encarta-se na Ordem Econômica (art. 184 da CF/88), por isso que a exação que lhe custeia (contribuição para o INCRA) tem inequívoca natureza de contribuição de intervenção no domínio econômico (CIDE), e não de contribuição para o custeio da Seguridade Social.[5]
Note que tais contribuições têm destinos inteiramente distintos. A contribuição para o INCRA não se destina a financiar a Seguridade Social. Ora, esta assegura direitos relativos à Saúde, à Previdência Social e à Assistência Social, enquanto aquela é contribuição de intervenção no domínio econômico (CIDE), destinada à reforma agrária, à colonização e ao desenvolvimento rural. [6]
6. A CONSTITUCIONALIDADE DA CONTRIBUIÇÃO AO INCRA
Como vimos, a contribuição para o INCRA possui natureza de contribuição de intervenção no domínio econômico, com fulcro no art. 149 da CF/88. Veja:
  • CF/88. Art. 149. Compete exclusivamente à União instituir contribuições sociais, de intervenção no domínio econômico e de interesse das categorias profissionais ou econômicas, como instrumento de sua atuação nas respectivas áreas, observado o disposto nos arts. 146, III, e 150, I e III, e sem prejuízo do previsto no art. 195, § 6º, relativamente às contribuições a que alude o dispositivo. (grifo nosso)
Cumpre indagar: o que é uma contribuição de intervenção no domínio econômico? A contribuição de intervenção no domínio econômico, também conhecida como contribuição interventiva, ou pela sigla CIDE, é um tributo de competência exclusiva da União, previsto no art. 149 da CF/88, que funciona como instrumento regulatório da economia. Vale dizer, “a CIDE é um tributo destinado a viabilizar a intervenção estatal na economia para organizar e desenvolver setor essencial, que não possa ser desenvolvido com eficácia no regime de competição de liberdade de iniciativa”.[7]
7. A REFERIBILIDADE DIRETA É ELEMENTO CONSTITUTIVO DAS CIDE’S?
A pergunta que se faz é a seguinte: A referibilidade subjetiva direta seria um requisito necessário para legitimidade da CIDE? Em outras palavras, é possível haver uma CIDE sem referibilidade subjetiva direta?
Em decisão no RE 396266 SC[8], o Supremo pronunciou-se pela primeira vez sobre a questão da referibilidade subjetiva como condição para a validade das CIDE. O STF destacou a necessidade de referibilidade objetiva da contribuição à intervenção pretendida. Quanto à referibilidade subjetiva do tributo ao contribuinte, o STF afirmou que tais modalidades “não exigem vinculação direta do contribuinte ou a possibilidade de auferir benefícios com a aplicação dos recursos arrecadados”. Em suma: não se exige a referibilidade direta em relação ao sujeito passivo da CIDE, pois esta caracteriza-se fundamentalmente pelo seu aspecto finalístico, ou seja, a intervenção do estado no domínio econômico, de modo a viabilizar os preceitos insculpidos no Título VII da CF (arts. 170 e segs.).
No que diz respeito à contribuição ao INCRA, o Dr. Luciano Dias Bicalho Camargos (Procurador do INCRA) [9] assim expôs:
“Com efeito, a exação em tela é destinada a fomentar atividade agropecuária, promovendo a fixação do homem no campo e reduzindo as desigualdades na distribuição fundiária. Consequentemente, reduz-se o êxodo rural e grande parte dos problemas urbanos dele decorrentes. [..] Dessa forma, a referibilidade das contribuições devidas ao INCRA é indireta, beneficiando, de forma mediata, o sujeito passivo submetido a essa responsabilidade. (grifo nosso)
Nessa mesma linha se firmou a jurisprudência do STJ por ocasião do julgamento do REsp 977.058/RS. Deste julgamento, destacamos as seguintes conclusões:
1) a referibilidade direta NÃO é elemento constitutivo das CIDE’s;
2) as contribuições especiais atípicas (de intervenção no domínio econômico) são constitucionalmente destinadas a finalidades não diretamente referidas ao sujeito passivo, o qual não necessariamente é beneficiado com a atuação estatal e nem a ela dá causa (referibilidade). Esse é o traço característico que as distingue das contribuições de interesse de categorias profissionais e de categorias econômicas;
3) as CIDE’s afetam toda a sociedade e obedecem ao princípio da solidariedade e da capacidade contributiva, refletindo políticas econômicas de governo. Por isso, não podem ser utilizadas como forma de atendimento ao interesse de grupos de operadores econômicos;
4) a contribuição destinada ao INCRA, desde sua concepção, caracteriza-se como contribuição especial de intervenção no domínio econômico, classificada doutrinariamente como contribuição especial atípica (CF/67, CF/69 e CF/88 - art. 149);
5) a contribuição do INCRA tem finalidade específica (elemento finalístico) constitucionalmente determinada de promoção da reforma agrária e de colonização, visando atender aos princípios da função social da propriedade e a diminuição das desigualdades regionais e sociais (art. 170, III e VII, da CF/88);
6) a contribuição do INCRA não possui referibilidade direta com o sujeito passivo, por isso se distingue das contribuições de interesse das categorias profissionais e de categorias econômicas;
CONCLUSÃO
A contribuição ao INCRA corresponde a 0,2% sobre a folha salarial. Esta contribuição deve ser paga pelas empresas de todos os segmentos da economia (empregadores rurais e urbanos) e se destina aos programas e projetos vinculados à reforma agrária e suas atividades complementares.
Por ter natureza de CIDE - e não de contribuição para o custeio da Seguridade Social - a contribuição ao INCRA não foi revogada pela Lei n. 7.787/89, tampouco pelas Leis ns. 8.212/91 e 8.213/91, estando em vigor até os dias de hoje. Vejamos. A Lei n. 7.787/89, ao instituir/unificar a contribuição previdenciária das empresas, suprimiu somente a contribuição ao PRORURAL (administrada pelo FUNRURAL), não tratando da contribuição ao INCRA. Ora, as Leis ns. 8.212/91 e 8.213/91 também não atinam com a contribuição ao INCRA.
Segundo o entendimento firmado pelo STF e STJ, o fato da contribuição ao INCRA não possuir referibilidade direta com o sujeito passivo, não retira sua legitimidade. Isso porque a referibilidade direta não é elemento constitutivo das CIDE’s. Vale dizer, não se exige referibilidade direta em relação ao sujeito passivo da CIDE, pois esta caracteriza-se fundamentalmente pelo seu aspecto finalístico, ou seja, a intervenção do estado no domínio econômico, de modo a viabilizar os preceitos insculpidos no Título VII da CF. Ora, a referibilidade das contribuições devidas ao INCRA é indireta, beneficiando, de forma mediata, o sujeito passivo submetido a essa responsabilidade.
 
Alice Saldanha Villar
Advogada e autora dos livros “Direito Sumular - STF” e Direito Sumular - STJ”, Editora JHMIZUNO, São Paulo, 2015 - Prefácio do Ministro Luiz Fux.


[1] Cf. TRF1 - AC 4111 MT 1998.36.00.004111-3, Rel. Des. Federal Antônio Ezequiel da Silva, 7ª Turma, 25/04/2008.
[2] Segundo a jurisprudência do STJ, “o único ponto em comum entre o FUNRURAL e o INCRA e, por conseguinte, entre as suas contribuições de custeio, residiu no fato de que o diploma legislativo que as fixou teve origem normativa comum, mas com finalidades totalmente diversas;” (STJ - REsp 977058 RS, Rel. Min. Luiz Fux, 1ª Seção, DJe 10/11/2008)
[3] Cf. STJ - REsp 977058 RS, Rel. Min. Luiz Fux, 1ª Seção, DJe 10/11/2008.
[4] Cf. STJ - AgRg nos EREsp 805166 PR, Rel. Min. Humberto Martins, 1ª Seção, DJ 20/08/2007.
[5] Cf. STJ - REsp 977058 RS, Rel. Min. Luiz Fux, 1ª Seção, DJe 10/11/2008.
[6] Cf. EDcl noAgRg nos EDcl no Ag 939.328/SC, Rel. Ministra Denise Arruda, 1ª Turma, DJ 4/08/2008.
[7] Cf. STF - Voto do Min. Ilmar Galvão no RE 177.137-2, Tribunal Pleno, DJ 18/04/1997.
[8] Cf. STF - RE 396266 SC, Rel. Min. Carlos Velloso, Tribunal Pleno, DJ 27/02/2004.
[9] Cf. CAMARGOS, Luciano Dias Bicalho. Da natureza jurídica das Contribuições para o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária. São Paulo: MP Editora, 2006, p. 368.